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os jovens (de hoje) são extremamente irresponsáveis. não sei se sou eu que sou um old spirit, mas talvez essa seja a verdade: do alto dos meus vinte e sete anos, julgo as gerações dois a sete anos mais novas, como se as visse separadas da minha por um hiato que não sei justificar. claro que esta primeira ideia é apenas uma generalização. conheço pessoas da minha idade que são completamente irresponsáveis, e pessoas muito mais novas que demonstram ser mais responsáveis do que pessoas com mais idade do que eu (incluindo os meus pais, por exemplo). e reconheço que embora eu possa ter sido irresponsável numa ou outra situação passada, nunca o fui de uma forma geral. com vinte anos, por exemplo, não fazia algumas das coisas que relatarei de seguida. aliás, nem essas coisas me passariam sequer pela cabeça.
mas a que se deve este meu devaneio sobre (ir)responsabilidade? é que no início deste mês fui a paris, apresentar um póster num congresso. como o meu centro de investigação não tem o hábito de pagar o que quer que seja aos alunos de doutoramento, tive de planear esta viagem com bastante antecedência, para garantir os preços mais baixos. em novembro do ano passado, decidi comprar a viagem de avião com promoção. boa escolha! uma amiga e colega minha que nunca visitara paris também ia apresentar o seu trabalho, e propus-lhe que fôssemos um dia antes para darmos uma volta antes do congresso. ela concordou, mas decidiu não comprar os vôos nessa altura. ela é, naturalmente, uma pessoa indecisa e, apesar da sua ansiedade com pequenos detalhes (como escrever e-mails, por exemplo), parece demasiado descomplicada para planear o que quer que seja com a antecedência necessária. poder-se-ia dizer, até, que ela aparenta ser um tanto irresponsável. ora, quando chegou a hora de pensar em alojamento, eu precisava saber se ela efectivamente quereria partilhar quarto comigo. andei meses a falar-lhe disso, e das viagens que ela deveria comprar... ela deixou andar, comprou os vôos muito mais caros do que eu mas, finalmente, em janeiro, dedicámo-nos a ver casas no airbnb. a situação complicou-se quando vimos que as casas disponíveis eram extremamente caras (oh là là!). uma das soluções seria dividir casa com uma outra amiga dela que iria participar no congresso como voluntária (para lhe pagarem o valor da inscrição). concordei, mas ao que parece, ela esqueceu-se de me mencionar que a tal amiga levaria o namorado. andámos semanas a discutir se eles iam ou não iam, para acabar a reservar uma casa para 3 hóspedes e depois ela dizer que ficaria com o namorado. entretanto, outra amiga dessa minha amiga, resolveu fazer o mesmo: voluntariado em troca da entrada para o congresso. o problema resolvera-se: dividiríamos a casa por 3, o que ajudava a poupar mais algum dinheiro.
o problema surgiu quando a primeira amiga talvez fosse precisar de alojamento, afinal de contas. o namorado ia ficar na casa dum amigo, e ela sem tecto. é que a minha amiga/colega só conta as coisas pela metade, e à medida que o tempo passa, e não há forma de voltar atrás, é que acrescenta detalhes em falta (outro sinal de irresponsabilidade). como fiz a reserva do airbnb em meu nome, não queria arriscar em levar mais um hóspede sem ter avisado a dona da casa (é que se algo corresse mal, quem se lixava era eu). cedi, e concordei que ela poderia ficar lá uma noite (depois de acertarmos todos uns detalhes) e decidimos não lhe cobrar nada por isso. também é de salientar que o apartamento, minúsculo, apenas tinha um sofá-cama e uma cama.
eu já tinha visitado paris, e arrependi-me de ter ido um dia mais cedo. deveria ter ido apresentar o póster e vir-me embora. no entanto, já não podia mudar os vôos. ou seja, fui com baixas expectativas. ainda assim, conseguiram desiludir-me. ficámos lá entre quarta-feira e sábado. no primeiro dia, eu e elas as 3 almoçámos no mc donald's, e fomos às compras para fazer o jantar, depois de um passeio. fiz o jantar, com gosto. elas gostaram, mas não agradeceram por tê-lo feito. ninguém se ofereceu para lavar a loiça, e eu tive de dizer "já cozinhei, não lavo a loiça". a minha amiga disse que lavaria. mas ups!, não havia lava-loiça suficiente. deixou a loiça de molho e disse que lavaria na manhã seguinte. tudo bem. na manhã seguinte, elas saíram cedo porque iriam trabalhar no congresso, e a minha amiga queria dar uma volta antes de passar pelo local do congresso. fizeram imenso barulho. quando decidi levantar-me, vi que não só não tinham lavado a loiça, como tinham deixado imensas coisas espalhadas pela casa (roupa, e sei lá mais o quê). tive de ser eu a lavar a loiça, com champô (porque se as coisas corressem mal, quem se lixava era eu). essa quinta-feira foi interessante, porque eu e a minha amiga ficámos até tarde no congresso (jantar incluído), e quando chegámos a casa estávamos cansados. a amiga que ficou lá de favor, tinha deixado a mochila dela e do namorado no nosso apartamento (para não passear com o peso), o que fez sentido. só que decidiram ficar fora, num bar, até pelo menos a meia noite, porque seria o aniversário dela, e queriam festejar (em conjunto com a outra amiga). o que faltou? terem ido buscar a chave. a porta do prédio só abria com a chave, e eles acharam por bem não levar chave, nem avisarem a que horas chegariam. o meu drama com isto? é que tenho o sono leve e depois de acordar, custa-me imenso a adormecer. decidi dizer-lhes que ficaria à espera deles, porque alguém tinha de lhes abrir a porta. fui mandando mensagens, a tentar perceber se eles iriam demorar. disseram que não. mas a meia-noite passou, e deixaram de me responder. a minha amiga adormeceu, e eu estava podre de cansaço. a irritação, contudo, não me deixou dormir. chegaram às duas da manhã, e depois ainda fizeram imenso barulho. já não tenho paciência para estas coisas. esta irresponsabilidade e falta de respeito pelos outros tira-me do sério.
claro que as coisas não melhoraram propriamente nos dois últimos dias. na sexta-feira (o aniversário da tal amiga), o dia começou com a cafeteira a espirrar café para todo o lado (porque a minha amiga não reparou no filtro caído), sujando tudo. tive de interromper o meu pequeno-almoço para limpar tudo, porque ela estava a tomar banho. disse-me da casa-de-banho que ela limparia, mas vocês não imaginam o nojo que aquilo ficou: borras de café no tecto, nas paredes, nas portas, em cima de fotografias, e até dentro de um armário cuja porta era metálica e com furos. acho que a cozinha ficou mais limpa depois disso do que quando lá chegámos. o pormenor é que quando efectivamente a minha amiga saiu do banho, ainda demorou uns momentos para realmente oferecer ajuda: esperou o tempo certo para já não ser preciso fazer muito. mais interessante foi o jantar: tínhamos combinado sair todos juntos para festejar o aniversário da tal amiga. acabámos por ir a um restaurante italiano que tinha pizzas baratas. depois disso, o amigo francês do namorado dela, que tinha trazido presunto e uma garrafa de vinho, sugeriu festejarmos num jardim. passámos o nosso apartamento, e eu disse que os convidava para entrar, mas que, como eram proibidas festas, disse que era melhor não. andámos mais uns metros e a outra amiga disse que precisa de ir a casa vestir uma camisola porque está frio (não tinha reparado que tínhamos passado já pelo apartamento). percebi que aquilo era uma desculpa esfarrapada para eles lá irem. comecei por ser um pouco inflexível, mas acabei por ceder com as condições de não se fazer barulho, lavarem a loiça (eu não iria lavar novamente), e não ficarem até muito tarde (continuava cansado). ok, ok, tudo muito bem. só que não. comeram, falaram e riram alto, puseram música parola a tocar no telemóvel. o francês parece ter sido o único com bom senso de reparar que uma da manhã era uma boa hora para irem embora. para pressionar sem querer ser indelicado, vesti o pijama e lavei os dentes em frente a eles. a mensagem não podia ser mais clara: estou cansado, preciso dormir. ainda demoraram a sair, porque o uber demorou. a minha amiga esqueceu-se de lavar a loiça, e eu passei-me. disse-me no dia seguinte lavaria. talvez como naquela manhã em que eu lavei a loiça? não ia acontecer novamente. ela ficou amuada, mas lavou a loiça. senti-me como o pai de alguém (e eu nem quero ter filhos). eu agradeci no final, e a outra amiga ainda se riu lá para o meio (embora não tenha mexido uma palha). estupidamente (ou irresponsavelmente), deixaram a tarefa de fazer a mala para a manhã do check-out. a outra amiga colocou o despertador para as 7h30 (acordando-me), mas só se levantou quase 1h depois. fez barulho a arrumar as coisas (como seria óbvio). quando saiu, deixou um copo sujo no lava-loiça. puta que a pariu. eu levantei-me, e tratei da minha vida tranquilamente. esperei que a minha amiga ficasse pronta para sair (demorou, porque ainda teve de fazer a mala).
houve outros sinais de irresponsabilidade na viagem que ficarão na minha memória, como a minha amiga perder o seu passe de 3 dias do metro, pedir-me o meu, e mais tarde ainda apanhar uma multa por ter deitado o bilhete dela fora antes do final da viagem. viagens com estas pessoas no futuro? não, obrigado.
posso parecer-vos um pouco exagerado, mas a verdade é que estas pequenas coisas se foram acumulando ao longo do tempo, e cansam-me. e se fossem coisas que acontecem só uma vez, era tranquilo, eu desculpava. mas é constante. a irresponsabilidade das pessoas à minha volta tira-me do sério. é que a mim ensinaram-me que quando partilhamos algum espaço com alguém, é bom manter o espaço agradável para todos. e nem era preciso terem ensinado, parece-me bom senso saber que espaços partilhados com outros devem ser mantidos como encontrados. faz-me lembrar casas-de-banho públicas: quando tenho de usar uma, e vejo a sanita suja, tira-me do sério; quem é irresponsável ao ponto de não limpar a sua própria merda? então, uso a sanita, e quando acabo por usar o piaçaba para limpar a minha merda, acabo por estar a limpar a merda dos outros. e já estou farto de limpar a merda dos outros, só por serem irresponsáveis.
e os detalhes são o pior. é como dividir casa com alguém que não sabe lavar bem a loiça, e encontramos, dia após dia, loiça mal lavada. por favor, usem água quente! eu não uso água quente por ter frio nas mãos, é mesmo para tirar a gordura e restos de comida mais facilmente! ou quando queremos lavar roupa, mas de repente vemos que a máquina está cheia de roupa de outras pessoas (às vezes por lavar, outras vezes molhada, por estender). ou quando mudamos as coisas comuns de sítio e não avisamos. é este desleixo constante que me tira do sério. e é tudo gente mais nova que eu. e eu não era assim com a idade deles. não percebo se é um efeito geracional ou não, mas foda-se! já não tenho idade para isto.
disclaimer: não estou a criticar a minha amiga em específico, mas utilizei-a como exemplo, porque se tratou da experiência mais recente e que me estava acessível no pensamento. pode ter sido errado, e a minha intenção não era, de todo, criticá-la pessoalmente. este blogue funciona, por vezes, como extensão do meu pensamento, e escrever sobre determinadas experiências ajuda-me a lidar melhor com elas. este é um exemplo disso. não quero ofender ninguém em particular.