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procuro
mas não encontro
o teu corpo no meio dos lençóis
não os sabia assim
vastos
como um oceano
como se te buscasse nas águas de um mar sem fim
só que em vez de maresia
é o teu perfume que sinto preso
no branco destas águas de algodão
lençóis e travesseiros,
todos cheios de ti
e eu nadando neles, envolto neles
para te sentir perto
e finalmente adormecer.
escrito a 27.05.2019
nunca foste do mar
mas há tanto mar em ti
para descobrir, para navegar,
para imergir e me afogar.
escrito a 23.05.2019
acordo sem saber o que são estes dias.
uma extensão do repetitório quotidiano,
que leva ao infinito o aborrecimento
repetitivo e constante.
o expoente máximo do tédio,
a previsão rotineira das horas que passam
e que, ainda assim, desiludem.
estes dias são tão repetitivamente fastidiosos
que já nem neles quero acordar.
escrito a 26.04.2019
sangue
substantivo masculino
tarde
«acordo sem saber o que são estes dias.», escrevi num poema recente. é isso que sinto, acho: já não conheço estes dias que vou vivendo. são todos igualmente desconcertantes, cheios de tédio e solidão.
tinha guardado no blog um rascunho de um post que escrevi em março de dois mil e dezassete, que se intitulava "das dúvidas", e que seria para eu desenvolver o que me atormentava na altura. e aqui está ele:
os dias cinzentos são os piores.
desenvolvi, ou tenho vindo a desenvolver nos últimos anos, um humor bastante depressivo, que me acompanha em todos os contextos da minha vida. manifestado mais por atitudes e comportamentos de irritação do que propriamente de tristeza, tornou-se cada vez mais constante.
o que penso estar por base desde estado negativo de humor tem que ver sobretudo com a minha insegurança pessoal nos mais diversificados contextos da minha vida. mas principalmente no profissional. sou, sempre fui, estudante. sinto que não sei fazer mais nada. sempre cresci com a ideia de que tinha de ser o melhor, e tentei sê-lo. nem sempre consegui, é certo, mas na verdade o propósito, a finalidade de sê-lo era, sempre será, em si, vazio. será que sou capaz?
vivemos com outras pessoas. só somos melhores em interacção com elas. sinto-me só. depois não quero ninguém. será que sou normal? parece que vivo numa qualquer eterna adolescência emocional.
afeiçoo-me demasiado, mas nem o sabia. será que ele gosta mesmo de mim?
e quando me sinto assim constantemente, pergunto-me: serão os dias cinzentos os piores?"
na altura em que isto foi escrito, estava a namorar com um ele há menos de três meses, e tinha iniciado o doutoramento. portanto, as dúvidas eram um tanto justificadas, penso eu. nunca desenvolvi o texto ao longo dos ano por duas razões: esquecimento, e as dúvidas acabaram por se esbater de alguma forma.
no entanto, agora que passaram dois anos, olho para trás e apenas sei dizer que os dias cinzentos não são os piores. os dias piores podem ser também os soalheiros. como ontem, ou hoje, em que o sol brilha e queima a pele e os olhos. sim, continuo com uma visão negativa da minha vida. mas é o que sinto.
estou neste momento num bloqueio extremo face ao que tenho de fazer, que é escrever artigos. ando a procrastinar demasiado, e a sentir-me um inútil. quando me quero distrair, acabo por não conseguir, ou recorro a séries ou filmes, ou jogos. às vezes penso ir nadar, mas perco quase sempre a vontade (o que piora a sensação de inutilidade). mas na verdade, o que quero é socializar. porque me sinto sozinho, e precisava que alguém me ajudasse a sentir-me menos inútil. acho que ele tenta, de alguma forma, mas está longe e não é a mesma coisa.
e é isso. ele está longe e sinto-me sozinho. mesmo com os amigos que tenho, (que, parece, são cada vez menos) sinto-me só. aliás, ontem e hoje, três pessoas diferentes fizeram questão de salientar quão poucos amigos tenho. uma dessas pessoas foi o meu pai, que me veio mudar um pneu, depois de ter um furo (história engraçada: sou tão inútil que não consegui encontrar a chave para mudar o pneu que estava na mala do meu próprio carro. e mesmo que tivesse encontrado, possivelmente a tentativa de mudar o pneu sozinho ia sair furada - pun intended). a verdade em relação aos meus amigos é esta: muitas vezes sinto vontade de sair, e penso ligar a alguém para irmos tomar um café. corro mentalmente a lista de pessoas com quem me sinto confortável ou próximo, e sei que ninguém iria concordar em tomar um café comigo, assim em cima da hora. sinto que ninguém terá disponibilidade para mim.
por outro lado, poderia recorrer à minha família, que está quase sempre disponível. mas a verdade é que nunca encontrei na minha família um lugar seguro e tranquilo, sobretudo nos últimos anos. apesar de todas as suas boas intenções, e de tudo o que fizeram por mim, e de todas as razões pelas quais lhes estou grato, há sempre um certo grau de frieza em como nos relacionamos. e por isso, surge sempre um leve desconforto quando passo demasiado tempo com eles. de vez em quando é agradável estar com eles, sim, mas não tanto quanto desejaria.
ou se calhar sou só eu que sou demasiado exigente com as expectativas que tenho em relação a quem me rodeia. e na verdade sou um merdas, que nem sozinho consegue estar. foda-se.
tenho sido um idiota.
várias bandas que aprecio (ou costumava apreciar bastante, pelo menos) voltaram ao activo no passado recente, e tudo me tem passado totalmente ao lado. sempre dei muita importância à música na minha vida, mas recentemente só tenho ouvido música nova na rádio, enquanto conduzo. dantes, quando andava de autocarro, e a pé, passava horas a ouvir música. e, por isso, tenho sido um idiota.
vampire weekend ressuscitaram com father of the bride, um álbum que passei as últimas horas a descobrir, e cujo excerto vos deixo aqui:
mas não só. weyes blood lançou recentemente um álbum, os of monsters and men também lançaram música nova, tal como os allah las. aldous harding, kevin morby, e até a lena d'água lançaram álbuns novos! por favor, ouçam. todos prometem.
eu, para tentar deixar de ser tão idiota, hei-de ver kevin morby, que virá a braga em julho.
tenho estado deprimido. uau, que surpresa, exclamam vocês. só que não, acrescentam. na verdade, este parece ser já o meu estado habitual. agora que reflicto, o que me atormenta é algo mais parecido com distimia do que depressão. de qualquer forma, tenho altos e baixos, como qualquer pessoa. só que os baixos são mesmo maus: não sinto motivação para nada, sinto-me inútil e ando sempre rabugento.
estou num desses baixos. depois de realizar um exame a uma cadeira de alemão que estava a fazer, não me resta nada para ocupar o tempo académico, que não seja o que mais odeio: escrever a tese/artigos. já não tenho desculpas para me escapar a esta tarefa. isso atormenta-me, porque preciso estar algo inspirado para conseguir escrever o que quer que seja. até que isso aconteça, vou sofrer alguns dias.
e logo pela manhã os dias começam mal, sem vontade de sair da cama. com o arrastar das actividades de vida diária, como tomar o pequeno-almoço, ou tomar um banho. hoje, fiz algo diferente: dancei. e eu sou aquela pessoa que não dança. mas hoje, na casa-de-banho, antes de tomar um banho quente, dancei nu esta música:
se calhar aquilo não foi bem dançar. mas vou considerar que sim, porque me tentei mexer ao som da música. e durante quatro minutos (repeti a audição da música), senti-me leve, e bem. claro que depois a sensação passou, e nem o banho ajudou. mas aqueles quatro minutos foram bons.
era só isto.
mata nacional do choupal, coimbra
maio 2019